Terça-feira, 8 de Junho de 2004
...continuo a acordar todas as noites...não há forma de o evitar...a tua ausência incendeia-me os sentidos...a tua falta provoca-me esta ânsia de te sentir presente... sofro neste sofrimento sofrido de dor e solidão...já não sei quem sou...também não interessa...lembras-te da última carta que te escrevi...sim, daquela em que acordei às 3 e 15 da manhã? Essa...sim, quando senti a tua falta e me acariciei como se fosses tu que o estivesses a fazer...oh meu amor, como sinto a tua falta!...Não, não sei que horas são...até o relógio me tiraram deste sepulcro...olho pelas frinchas da janela e vejo luar...não sei a quantos estamos...mas isso tem importância? Que valor terá o dia em que me encontro se não te encontro num só momento? Desespero neste tormento de sentir a tua falta e não te sentir a presença...Como poderia sentir se tudo o que sinto é dor? Todos os nossos momentos me passam pela memória e esta lembrança chora, chora como se fosse ela a minha própria alma e eu não existisse...Aqui onde estou não me lembro do que sou, só me lembro de ti e de todos os momentos em que estive contigo e contigo vivi...Sim, agora não vivo, apenas recordo...Dizem que recordar é viver...oh meu amor como pode ser viver se cada vez que me lembro, sinto que estou a morrer...as tuas mãos estão aqui no meu peito apertando-me os seios como tu tanto gostavas de fazer...a tua boca na minha boca e a humidade da tua língua na minha língua...o doce beijo nos meus mamilos e como as tuas mãos me penetravam com doçura e força ao mesmo tempo...oh meu bem, como te amo tanto...como te quero tanto...oh meu bem que lágrimas tão amargas estas que broto a todo o momento...olha, devem ser 4 da manhã...vem aí a enfermeira com a injecção do costume...continuam a dizer que esta minha loucura não tem cura...eu sei que não tem, como poderia ter? Como me posso curar da tua ausência? Como posso viver nesta minha morte? Não sei meu amor, não sei. A enfermeira me aconchegou os cobertores...sabes, está frio e sinto frio dentro de mim...já não consigo falar...apenas olho no vazio...neste vazio que me preenche...Mas não preciso de mais nada, basta-me a lembrança dos momentos que vivemos...basta-me esta dor que vive comigo...basta-me estas lágrimas... o meu pão de cada dia...o meu alimento neste vazio...sinto os olhos pesados...sei que vou dormir mais um pouco mas estou feliz pois vou dormir contigo nos meus braços, nestes braços que não te sentindo te lembram, te tocam, te apertam contra mim...lembras-te de quando adormecíamos assim? Como era bom acordar a meio da noite com os braços dormentes e sentir o calor do teu corpo abrasar este meu ser que de tanto te querer te perdeu...oh meu amor, como te amo... como sinto a tua ausência...vou dormir...até mais logo...lembra-te de mim como me lembro de ti...um resto de noite feliz, meu amor...
a tua Maria
(republicação)
Segunda-feira, 7 de Junho de 2004
...no muro em frente de minha casa, um conjunto diverso da mesma flor,
formando um único manto, uma unidade de aroma e de cor...
Sábado, 5 de Junho de 2004
...a solidão está em nós quando o quisermos... a solidão é apenas um estado de Alma e não um estado físico... mesmo sózinhos estamos sempre com a nossa vontade de não estarmos sós... é preciso força para estar aqui e noutro lado ao mesmo tempo, estar só e não estar...
Sexta-feira, 4 de Junho de 2004
"Tenho nada nas mãos e pouco mais,
Fantasias e sonhos, nada mais.
Na alma, a branda doçura,
Sofreguidão, loucura!
Ânsias perdidas, lonjura.
Sacudo o céu em fúria,
Tudo quero para mim,
E enquanto na rebeldia não tenho,
No ímpeto do nada que retenho,
Fico com o Universo,
No recanto das minhas mãos vazias"
(from: Vulcânica)
Quinta-feira, 3 de Junho de 2004
...nos canteiros aqui do meu quintal junto da porta que dá para este meu "escritório", a vulgaridade desta erva de hortelã mas cujo aroma refresca o ambiente desde manhã...
Quarta-feira, 2 de Junho de 2004
Hoje demente, fui com a mente inchada
Para a maternidade das palavras.
Dei entrada num quarto vazio de ideias;
Não vi parteiras nem obstetras,
Nem marquesas nem banco de letras;
Somente paredes brancas caiadas há já muito tempo
Limpas de memórias e de histórias.
Deitei-me e acomodei-me o melhor que pude
Na espera expectante do passar das horas;
Posicionei a mente inchada aguardando
O tempo necessário para dali me vir embora
Com algo que tivesse de mim nascido cá para fora.
Peguei nos fórceps e nos bisturis
E cortei a mente em pedaços;
Forcei a palavra a sair
Mas não dei por nada
Nem que de letras m`estava a parir;
Apenas esperei que o tempo passasse
Ora lento ora fugidio
De ideias ou demências
Parcas em odes, prosas ou poesias
Mas apenas saiu a desgraça
Desta imensa sensaboria
Terça-feira, 1 de Junho de 2004
...lembrar a criança que há ainda em todos nós
...lembrar a criança que um dia já fomos
...o carrinho de bois em madeira
...o carro de bombeiros de folheta
...e uma pequena trombeta
...e a delícia do Cavaleiro Andante
...que ainda justifica que procure
...que caminhe e demande
(photo from: Provins.net)